sábado, 27 de novembro de 2010

TJSC decide que é legal a atuação da GMT na fiscalização de trânsito.

Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2008.076978-2, de Tubarão
Relator: Des. Newton Janke

GUARDA MUNICIPAL DE TUBARÃO. FISCALIZAÇÃO E
AUTUAÇÃO DE INFRATORES DO CÓDIGO DE TRÂNSITO
NOS LIMITES DA COMPETÊNCIA ATRIBUÍDA AO MUNICÍPIO.
SUPOSTA INTROMISSÃO NA ATRIBUIÇÃO
CONSTITUCIONAL PRECÍPUA DA POLÍCIA MILITAR DE
GUARDA E FISCALIZAÇÃO DO TRÂNSITO URBANO.
INOCORRÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE AFASTADA.

Para assegurar o exercício do Poder Administrativo de
Polícia, o Município, sob a licença do art. 30, inc. I, da
Constituição Federal, e do art. 112, inc. I, da Constituição
Estadual, pode atribuir à Guarda Municipal competência para
executar a fiscalização do trânsito, autuar e aplicar medidas
administrativas e penalidades nas hipóteses autorizadas pelo
art. 24 do Códido de Trânsito Brasileiro.

SEGUE ABAIXO ALGUNS TRECHOS DA AÇÃO:
RELATÓRIO:

Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Exmo.
Procurador-Geral de Justiça do Estado de Santa Catarina, por intermédio do
Coordenador Geral do Centro de Apoio Operacional do Controle da
Constitucionalidade (CECCON), em face do Município de Tubarão, buscando
desconstituir, especificamente, o inciso III do art. 3º da Lei Complementar Municipal nº
10/2005, que, criando a Guarda Municipal de Tubarão, atribui-lhe a seguinte
competência:

"Art. 3º Compete à Guarda Municipal:
[...];
III -Fiscalizar e autuar os infratores do Código de Trânsito Brasileiro, nas
infrações de competência do Município e as do Estado, se por ele delegadas".
"o Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de
planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de
veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia,
operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de
recursos e aplicação de penalidades".

Como se vê ou como se lê, o legislador não quis atribuir ao Município o papel de protagonista
secundário ou de mero espectador nessa relevante matéria que
desafia a permanente atenção e preocupação de todas as esferas do Poder
Federativo.
E remarcou esse propósito, logo adiante, ao registrar que compõem o
Sistema Nacional de Trânsito "os órgãos e entidades executivos de trânsito da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" (CTB, art. 7º, inc. III) e bem assim
"os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios" (CTB, art. 7º, inc. IV).

Buscando delimitar a competência e evitar indesejáveis conflitos de
atribuições, o art. 24, do CTB, por sua vez, listou as tarefas autorizadas aos
Municípios, nos seguintes termos:
"Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos
Municípios, no âmbito de sua circunscrição:
I -cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de
suas atribuições; [...];
V -estabelecer, em conjunto com os órgãos de polícia ostensiva de trânsito, as
diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito; [...];
VI -executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas
administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada
previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito;
VII -aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de
circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando os infratores
e arrecadando as multas que aplicar;
VIII -fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas
cabíveis relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos
veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar;
XI -arrecadar valores provenientes de estada e remoção de veículos e objetos,
e escolta de veículos de cargas superdimensionadas ou perigosas; [...];
XX -fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos
veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66,
além de dar apoio às ações específicas de órgão ambiental local, quando solicitado; [...];

Segundo visto antes, o CTB conferiu competência aos órgãos e
entidades executivos de trânsito dos Municípios para executar a fiscalização do
trânsito, autuar e aplicar medidas administrativas e penalidades, nas hipóteses dos
incisos VI, VII, e VIII do art. 24 do CTB, todas tratando de situações de inequívoco
interesse local.
"As funções mais específicas e dentro já da circulação constam no inc. VI, em
que está descrita a ampliação da atividade municipal relativamente ao trânsito, no
que era omissa a lei no passado. Atribuíram-se aos órgãos e entidades executivos
novas funções, que consistem, dentro da execução e fiscalização das leis de trânsito,
na autuação e na aplicação das medidas administrativas cabíveis, por infrações praticadas na
circulação, no estacionamento e na parada, desde que previstas as infrações no Código.
É certo que a constitucionalidade de qualquer norma não pode ser
aferida com base e a partir da legislação infraconstitucional. Contudo, na hipótese,
não cabe olvidar que compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse
local (art. 30, inc. I, CF; art. 112, CE). E, em todas as tarefas delegadas pelo CTB, há,
inegavelmente, como já dito linhas antes, forte interesse local.
A notória e crônica insuficiência de efetivo da Polícia Militar para cuidar
das tarefas típicas e precípuas de segurança pública resultaria em que, vedada
linearmente a atuação dos Municípios, em muitas cidades o trânsito seria a
materialização do caos e da impunidade porque, afinal de contas, os motoristas, não
ignorando o absenteísmo da corporação castrense, poderiam, exemplificativamente,
estacionar e circular como bem lhes aprouvesse, com olímpica indiferença aos
regramentos validamente instituídos nessas orbes locais. Isso, em outras palavras,
representaria aniquilar, em larga medida, o Poder Administrativo de Polícia dos
Municípios.
No dizer de Hely Lopes Meirelles, "o trânsito e o tráfego são daquelas
matérias que admitem a tríplice regulamentação -federal, estadual e municipal -,
conforme a natureza e âmbito do assunto a prover. A dificuldade está em se fixar,
com precisão, os limites da competência das três entidades estatais que concorrem
na sua ordenação. [...]. De um modo geral, pode-se dizer que cabe à União legislar
sobre os assuntos nacionais de trânsito e transporte, ao Estado-membro compete
regular e prover os aspectos regionais e a circulação intermunicipal em seu território,
e ao Município cabe a ordenação do trânsito urbano, que é de seu interesse local (CF,
art. 30, I e V)" (Direito Municipal Brasileiro. 15 ed., São Paulo, Malheiros Editores,
2006, p. 444-445).
Sob essa perspectiva, é indiscutível que a atuação do Município,
enquanto órgão do Sistema Nacional de Trânsito, de execução e fiscalização das leis
de trânsito, de autuação e de aplicação das medidas administrativas cabíveis,
insere-se no âmbito dos "serviços" municipais cuja proteção pode ser atribuída às
Guardas Municipais, nos termos do §8º do art. 144 da Constituição Federal,
dispositivo este que, por precedência hierárquica, as Cartas Estaduais não podem
contrariar.

Na mesma linha, há pronunciamento recente da Corte Mineira:

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI E DECRETO
MUNICIPAIS. GUARDA MUNICIPAL. PODER DE ATUAÇÃO. POLICIAMENTO DO
TRÂNSITO E IMPOSIÇÃO DE SANÇÃO PECUNIÁRIA AOS INFRATORES.
POSSIBILIDADE. REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Em consonância com o posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, o
Município detém competência para coibir o estacionamento em locais proibidos,
inclusive com competência para impor multas, ou seja, sanção pecuniária de caráter
administrativo. 2. Não basta só a fiscalização: uma fiscalização sem sanção não
significa nada; do contrário. Ela nem precisaria existir. 3. Desta forma, a aprovação
do projeto de Lei pelo legislativo local, sancionado pelo Prefeito Municipal, vem
apenas atender a uma realidade do Município de Belo Horizonte. 4. Representação
julgada improcedente" (TJMG/ADI n° 1.0000.08.479114-4/000, de Belo Horizonte,
rel. Des. Alvimar de Ávila, DJ 12/03/2010).

DECISÃO:

Nos termos do voto do relator, o Egrégio Órgão Especial, após
proclamada, por maioria, a legitimidade do Coordenador Geral do CECCON, julgou,
por unanimidade, improcedente a ação. Vencidos os Excelentíssimos
Desembargadores José Volpato de Souza, Cesar Abreu, João Henrique Blasi e o
Relator.
Presidiu o julgamento, realizado em 03 de novembro de 2010, o Exmo.
Des. Trindade dos Santos, com voto, e dele participaram os Exmos.
Desembargadores Lédio Rosa de Andrade, Sérgio Izidoro Heil, João Henrique Blasi,
Jorge Luiz de Borba, Carlos Prudêncio, Gaspar Rubik, Cláudio Barreto Dutra, Solon
d'Eça Neves, Mazoni Ferreira, Irineu João da Silva, Wilson Augusto do Nascimento,
Nelson Schaefer Martins, José Volpato de Souza, Sérgio Roberto Baasch Luz,
Fernando Carioni, Cesar Abreu, Ricardo Fontes e Jaime Ramos, lavrando parecer
pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Procurador Raulino Jacó Brüning.

Florianópolis, 08 de novembro de 2010.
Newton Janke RELATOR

Fonte: TJSC. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...